O apagar das luzes da gestão do prefeito Roberto Góes (PDT), em
Macapá, não tem sido nada republicano. Montada desde o final de outubro,
a comissão de transição do prefeito
eleito, Clécio Luís (PSOL), não consegue acessar informações relevantes
da prefeitura, como montante de dívidas, o numero real de servidores,
folha de pagamento, contratos e convênios em andamento, situação
fundiária, entre outras. Góes declara publicamente que facilitará o
processo, mas nos bastidores o comando é outro.
Dia 30 de outubro, Clécio anunciou sua equipe de transição. No dia 1º
de novembro a equipe entregou na prefeitura o Ofício direcionado ao
prefeito, apresentando o coordenador da transição, economista Charles
Chelala, e solicitando início dos trabalhos. No dia 05 de novembro, após
três tentativas sem sucesso de obter agenda com Roberto Góes ou seu
secretário de governo, Alberto Góes, a equipe informou a sociedade,
através da imprensa, das dificuldades.
Pressionado pela repercussão, Roberto Góes comunicou-se com Clécio
Luís combinando encontro para o final da manhã do mesmo dia. A reunião
foi rápida, e na ocasião o prefeito em exercício disse que Clécio
herdaria dívidas, como ele havia herdado, mas que facilitaria todo
o processo de transição, nomeando o advogado Antônio Meireles como
coordenador por parte de sua gestão.
A partir de então, a equipe de Clécio passou a trabalhar com
informações extraoficiais, informando a sociedade através da imprensa e
de um blog criado para esse fim – www.blogdatransicaomacapa.blogspot.com.br.
Parte da afirmativa do prefeito Roberto Góes se cumpriu, a que
anunciava a herança de dívidas. A outra parte, que oferecia colaboração,
não ocorreu. No dia 13 de novembro Charles Chelala encaminhou ofício
pedindo informações oficialmente, uma vez que o diálogo não resultou
frutífero.
O documento estabelecia um prazo de sete dias para a entrega de um
conjunto de informações. Faltando 34 dias para a mudança de governo, a
Comissão de transição do Prefeito Clécio não recebeu nenhuma informação
oficial, mostrando que há enorme distância entre o discurso de
colaboração e a tentativa real de dificultar a vida da nova gestão.
De maneira extraoficial e a partir de denúncias da sociedade civil,
de funcionários de carreira e de visitas in loco, neste primeiro mês de
trabalho da Comissão de Transição foi possível comprovar que a atual
gestão está deixando a cidade em completo abandono e não está zelando
pela continuidade dos serviços.
Saúde
Na área da saúde há precariedade nas UBS, UPA e SAMU do município de
Macapá. É uma realidade a suspensão das atividades nas UBS por falta de
material para o atendimento e por falta de limpeza, alimentação e
combustível. No SAMU há falta de alimentação para os trabalhadores e
retenção de combustível, impossibilitando o atendimento feito pelas
ambulâncias. Faltam recursos humanos e financeiros para o pleno
funcionamento do conselho.
No PACS\PSF os trabalhadores começaram a receber carta de exoneração
e, ao mesmo tempo, a atual gestão da prefeitura tem feito novas
contratações para a área. Estão sendo demitidos profissionais como
médicos, enfermeiros e assistentes que estavam no programa desde o
início, em 2000. Um exemplo de reação popular contra essa medida
aconteceu no bairro Marabaixo, onde o médico pediatra Anderson Valter
foi demitido por telefone.
O município vive uma epidemia de Malária, mas falta material e há
retenção de combustível também para a ação dos agentes de saúde que
fazem o combate à proliferação do mosquito transmissor. Eles também não
estão recebendo o pagamento do adicional noturno. E há uma grande
incerteza se a atual gestão deixará em estoque medicamentos necessários a
continuidade dos trabalhos em janeiro de 2013, situação que pode
agravar ainda mais o caso vivenciado nesta área vital para a cidade.
Educação
A Secretaria Municipal de Educação não é gestora plena dos recursos
da pasta. Obras são licitadas pela Secretaria de Obras e pagamentos
centralizados na Secretaria de Finanças. O Programa Escola Viva, que
deveria distribuir cestas básicas, kits escolares e três refeições para
todos os alunos da rede municipal, é pouco transparente, não havendo
rubrica específica para ele e suas despesas são diluídas nos custos da
SEMED.
Nessa área a nova administração herdará uma série de passivos e
impasses na efetivação de obras e serviços, por que muitos fornecedores
não estão sendo pagos pelas mercadorias fornecidas a PMM. Pode faltar
merenda em 2013 por causa de pendências na prestação de contas junto ao
Fundo Nacional da Educação – FNDE, que se arrastam desde 2006. Com
direito a 30 creches do programa federal Brasil Carinhoso, a prefeitura
só iniciou a habilitação de quatro, mas por falta de oferecer terrenos
legalizados e concluir os projetos técnicos, essas unidades não saíram
do papel.
Assistência social
Na área da assistência, uma excentricidade que só se explica pela
irresponsável prática de utilizar a pobreza para obter votos. O
CadÚnico, cadastro federal dos programas assistenciais, como bolsas e
habitação popular, foi deslocado da pasta que cuida da área social para o
Instituto Municipal de Turismo, pouco antes do início da campanha
eleitoral.
Nos Centros de Referência em Assistência Social – CRAS o caos está
instalado, com atraso no pagamento dos trabalhadores, exercendo suas
funções sem contrato. Há uma ação judicial para pagamento de progressão
funcional. As ações dos CRAS estão interrompidas por falta de material,
veículos e insumos. Também falta logística para o funcionamento do
Centro Municipal de Assistência Social.
A prefeitura recusou-se a aderir ao Serviço Socioassistencial que
transfere recurso financeiro do governo federal ao município. O prefeito
Roberto Góes recusou também a transferência de recurso financeiro do
governo do estado ao município, alegando que estaria sendo vítima de
pegadinha. Ele utilizou na campanha eleitoral o discurso de que a
prefeitura não executava os serviços por falta de apoio do estado.
Convênios
No Sistema Nacional de Convênios – SICONV, a Prefeitura de Macapá tem
22 convênios, sendo que 14 deles, somando R$ 23.900.376,00, estão
paralisados. A inoperância na obtenção de recursos federais pode fazer
com que Macapá perca R$ 12.037.876,00 até o final de dezembro deste ano,
fim da vigência de seis desses convênios. Entre eles está a terceira
etapa da reforma do Estádio Municipal Glicério Marques, construção de
calçadas e meio fio, recuperação e pavimentação de vias da cidade,
construção de uma Unidade Básica de Saúde no bairro Renascer e
construção de casas populares.
Orçamento
O Projeto de Lei Orçamentária Anual – PLOA para 2013, apresentado
pela gestão do prefeito Roberto Góes à Câmara de Vereadores, é
temerário. Os números estimados são incoerentes e não encontram
justificativa na realidade das contas da PMM. Uma análise no Orçamento
de 2012, mostra que há enorme distância entre o que foi orçado e o que
será realizado neste ano. A receita corrente da PMM deve cair em 5,3%
até o final do ano. A gestão de Góes superestimou a entrada de recursos
federais e subestimou a entrada de recursos estaduais. Também estimaram
errado alguns impostos municipais, com destaque para o IPTU (-22,9%),
além da receita da dívida ativa (-59%).
No caso do IPTU, considerando o que vai ser arrecadado esse ano, a
prefeitura aponta um crescimento de 20,9%, o que não se sustenta na
realidade dos números. Ano passado, a prefeitura estimou que fosse
arrecadar R$ 7,8 milhões em 2012, mas vai fechar o ano com uma
arrecadação de R$ 4,9 milhões de IPTU. Outra incoerência foi detectada
no Imposto de Renda retido na fonte. Estimaram para 2012 R$ 7,8 milhões e
vão arrecadar bem mais, R$ 11,2 milhões. Estão estimando para 2013 R$
12,4 milhões, mas a diferença de R$ 1 milhão não se explica.
O contrário acontece em relação à dívida ativa: estão informando que
vai aumentar 26,9%. Ano passado estimaram para 2012 R$ 6, milhões, mas
só vão arrecadar R$ 2,7 milhões. Quanto à arrecadação do FPM, estão
superestimando, dizendo que vai crescer 9%, quando o crescimento de 2012
caiu 3,2% em relação a 2011. O ICMS foi subestimado em 2011 e estão
subestimando novamente agora. Não há como confiar e essa falta de
clareza e de critérios causa insegurança quanto ao futuro da gestão
municipal.
As incoerências da PLOA também aparecem na distribuição de recursos
pelos setores da administração. A proposta reduz drasticamente os
recursos do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de
R$ 538 mil para R$ 310 mil, uma diferença de – 42,4%. Reduz também os
recursos de outro setor estratégico para o atendimento aos mais pobres, o
Fundo Municipal Habitacional de Interesse Social – FMHIS. Nesse caso o
corte é de – 62%, caindo de R$ 6.792.305,00 para R$ 2.580.127,00.
Responsabilidade Fiscal
Roberto Góes não tem como justificar as despesas da prefeitura com
pessoal, sua gestão extrapolou o limite em 54% da receita corrente
líquida do município, com percentuais que só cresceram a cada ano: em
2009 esse percentual foi de 55,79%; em 2010, de 59,35%; em 2011, de
56,88%. Já no exercício atual, com dados de até agosto, cresceu para
61,91%. A redução do quadro teria que ser feita necessariamente até dois
quadrimestres posteriores à detecção da irregularidade, mas não foi
feita.
Por exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, estados e municípios
devem publicar, no site mencionado, o Relatório Resumido da Execução
Orçamentária, bimestralmente, e o Relatório de Gestão Fiscal,
quadrimestralmente. Em todos os anos do mandato do prefeito Roberto
Góes, a prefeitura descumpriu o limite das despesas com Pessoal
estabelecido nos arts. 18 a 20 da LRF. Esta situação, além do evidente
desequilíbrio nas contas públicas, pode provocar perda de recursos
federais e aumento das carências da população.
Previdência
No dia 26 de dezembro expira o Certificado de Regularidade
Previdenciária do Município de Macapá. Ocorre que esse documento não
poderá ser renovado porque a prefeitura descumpriu pelo menos seis
exigências básicas. A mais grave delas, é que a gestão de Góes não vem
repassando para a Macapá Previdência o desconto previdenciário que faz
nos contracheques dos servidores, muito menos sua contrapartida
patronal. O montante do rombo ainda não foi revelado.
Sem renovar o certificado Macapá terá suspensas as transferências
voluntárias de recursos da União; terá impedimentos para celebrar
convênios, acordos e contratos; receber empréstimos, financiamentos e
subvenções de órgãos da administração direta e indireta da União;
celebrar empréstimos e financiamentos com instituições financeiras
federais.
Legalização de terrenos
Há fortes indícios de irregularidades na Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Urbano e Habitacional – SEMDUH. Responsável pela
legalização de títulos fundiários, a secretaria tem movimentação
suspeita no final da gestão. Informações extraoficiais dão conta de que a
exoneração do gestor da pasta se deu para acelerar a distribuição e
legalização sem critérios rigorosos dos terrenos do município.
A emissão obscura de títulos e a desafetação de áreas para postos de
combustíveis então entre as denúncias. Para facilitar o desmonte, as
câmeras de segurança do prédio da SENDUH foram desligadas, a equipe de
tecnologia da informação substituída e documentos queimados.
Coleta de lixo
Contratada a título de emergência pela prefeitura, por seis meses, a
empresa CLEAN, que faz a coleta de lixo, varrição e capina em Macapá,
segundo informações oficiosas não é paga há quatro meses. O mesmo
acontece com 12 caçambeiros contratados para realização de serviços
pesados. A PMM não informa o valor desse contrato, que encerra no dia 22
de dezembro próximo. Há ainda outra dívida, com a empresa ENTERPA, que
detinha o contrato do lixo até o primeiro semestre deste ano.
O aterro controlado é gerenciado pela empresa Rumos Engenharia
Ambiental, contratada pela PMM para prestar o serviço por 25 anos. A
prefeitura tem débito com a empresa no valor aproximado de R$ 3 milhões,
referentes a dívidas antigas e a quatro meses de falta de pagamento dos
serviços. O valor mensal médio de pagamento à empresa varia entre R$
380 mil a R$ 400 mil.
Até o final de dezembro o aterro controlado passará a ser um aterro
sanitário, com isso, não será mais permitida a entrada de catadores
(carapirás) na área. A prefeitura havia se comprometido em estruturar um
galpão para a triagem e a orientação aos catadores para que se
organizassem através de uma cooperativa, mas não cumpriu nada do que
prometeu. Significa que essas pessoas ficarão sem nenhuma fonte de
renda.
—
Márcia Corrêa